Friday, August 31, 2007

Inebriação

Engana-me uma vez mais. Imploro-te que agarres em mim e me sussurres todas as mentiras boas que fores capaz de reunir. Que a consciência não te pese: afinal, estás a fazê-lo com o meu consentimento, todas as consequências serão assinadas por mim. Engana-me. Engana-me. Faz de mim gato e sapato, joga os meus sentimentos à parede, ilude-me. Envolve-nos aos dois num nevoeiro escuro e deixa que a densidade astronómica do ar nos sufoque. Tens medo? Estaremos juntos, com todas as mentiras que criámos à nossa volta. Morreremos num ambiente familiar, sem que sejam necessárias despedidas tristes.

Fotografia: http://olhares.aeiou.pt/_das_maiores_invencoes/foto1421120.html

Thursday, August 30, 2007

Jogos de Roda, Parte II

Tenho uma criança a rodar nos meus braços. E a sorrir. Não sei se para mim, se para o Mundo, se para si mesma. O facto é que sorri: como se só ela percebesse a dimensão daquilo que a faz feliz. O que ela não sabe (talvez desconfie…!) é que aquele sorriso torna o Mundo um lugar com menos medo de existir.

Não me sinto a viver um sonho mas sinto-me, definitivamente, a viver a minha vida. E, acreditem, é uma sensação muito boa. Desconfio até que se algumas pessoas soubessem quão bom é, viveriam mais as suas.

* Fotografia: http://olhares.aeiou.pt/s_t/foto1056162.html

Tuesday, August 28, 2007

Oh yeh!

O amor é uma necessidade intrínseca. Depois de algum tempo aqui, neste nosso Mundo (ou Mundo nosso?), percebemos que a nossa tarefa suprema não é nada mais, nada menos do que conhecermo-nos a nós mesmos. E, passado o rasgar de reacção ao ridículo que se desenha na nossa face (afinal, como podemos não nos conhecer?), compreendemos quão complexa é a tarefa. Porque é uma função eterna, que dura exactamente o mesmo tempo que nós. Enquanto vivermos, lutamos desesperadamente pelo conhecimento e enriquecimento de nós mesmos.
É num momento de desespero que sentimos necessidade de trespassar a tarefa. Desejamos secretamente que a pessoa escolhida consiga aquilo que nós não conseguimos e murmuramos ao seu ouvido “conheces-me melhor que eu mesma”. Entregamos a nossa somatognosia e o nosso "eu psíquico" e ficamos assim, à espera que o trabalho apareça feito.
Acontece que, na realidade, sabemos que mesmo que isso seja verdade, não estamos livres do desafio. Afinal, não podemos desistir de nós mesmos. E sabemos que temos que continuar a caminhar e a lutar “enquanto houver estrada para andar”. Contudo, sabemos também que o percurso é muito mais agradável quando estamos acompanhados por quem amamos. Oh, se é!

Friday, August 24, 2007

Madrid

Imagem de: http://simplesmentesuse.blogs.sapo.pt/

Respiro com força o ar da cidade. Nova para mim, coleccionadora de memórias em relação ao Mundo. Prendo-me nos edifícios, balanço o andar, indecisa em passar ao próximo passo ou em ficar eternamente a admirar o postal que é oferecido aos meus olhos. Decido continuar o caminho e não me arrependo. Postal a postal, flor a flor, encanto a encanto, descubro um lugar no qual me sinto encaixar.
As pessoas que passam por mim são fascinantes. Muitas cores, muitos sentimentos estampados nos rostos e nos corações. Aqui, cada um é dono de si mesmo e isso basta. Aqui, goza-se uma coisa que eu gosto muito: liberdade social. E, no entanto, eu não me sinto perdida na indiferença que muitas vezes lhe está associada.

Sunday, August 19, 2007

Lado a Lado

Os melhores concertos são aqueles que se transformam num pacto de paz. São aqueles em que os cantores da plateia cantam pelo menos tanto como os do palco e em que, tanto uns como outros, adoram ouvir-se. São aqueles em que não conseguimos prender a voz na garganta e a largamos, num gesto de pura liberdade. Quando sentimos que somos capazes de ouvir de olhos fechados mas os queremos manter abertos, quando temos os sentidos seduzidos, quando poderíamos ficar ali “até ao fim da vida, ou talvez só até amanhecer”… É aí, nesses concertos, que temos a bola colorida entre as mãos e, como crianças que somos, o Mundo pula e avança.

Nos melhores concertos construímos castelos de sonhos. Apetece-nos saltar para cima do palco, abraçar quem lá está e repetir infinitamente “obrigado, obrigado, por favor continuem”. Sentimos cada música como se fosse nossa. As recordações assaltam-nos, esboçamos um sorriso e afastamo-las, mesmo que momentaneamente, porque o que importa é o presente, este presente (de agora e de mimo). Entrelaçamos os dedos com todos os sentimentos bons que existem e ficamos assim, lado a lado com eles.

Sunday, August 05, 2007

A regressar de nunca ter partido

Dá-me um beijo ruidoso na face. Abraça-me com força, até eu sentir a cabeça a andar à roda e os pulmões a implorarem por oxigénio e diz que gostas de me ver, que tinhas saudades minhas e que estou com um ar saudável de maresia e sonhos.
Dá-me tempo de olhar para ti. Sempre o mesmo, os mesmos tiques de intelectual, a mesma força meiga. Oh meu querido, que falta me fizeste!
Olha-me nos olhos;
“- Como foram as férias?”
“- Boas. E as tuas?”
“- Também”.
A cumplicidade transborda dos sorrisos, dos gestos, da alma. E o Mundo desvia-se de nós, de esguelha, de inveja.
Gritas-lhes que dor de cotovelo é uma coisa muito feia, dás-me o braço e levas-me para um jardim.
“- Tenho tanta coisa para te contar!”
Não precisas, eu sei tudo. Estava lá, lembraste? No Tamisa, nos passeios e nos candeeiros de Londres, nas fachadas dos prédios. Estava em ti. E tu em mim, enquanto deambulava pela praia, a pensar se a minha vida está certa enquanto repetia sistematicamente que a vida não precisa de um certificado de validez.
Sente o meu bronze na tua pele e nota como o meu inglês melhorou. Deixa-me encostar a cabeça no teu ombro e rir, deixa-me dizer-te que tens razão, que vou seguir com a minha vida e ser feliz sem dizer nada a ninguém. Passa-me a mão pela cabeça, faz papel de pai. E deixa-me perguntar-te se usaste boné e atravessaste sempre na passadeira.
Amo-te. Oh, amo-te tanto! Não enquanto rapaz, isso seria restringir a importância que tens na minha vida. Amo-te enquanto pessoa, amo-te o mais que se pode amar um amigo.
Gritemos juntos, a uma só voz, baixinho. Está sol de Setembro, apesar de ainda ser Agosto, e o vento acaricia-nos.
Prometo-te: mesmo que um dia a vida te leve para longe, eu estarei sempre perto. Quanto mais não seja, nas recordações, no coração. Fazes parte das minhas estruturas, somos cada um uma parte que já não cabia no outro e que, por isso, nasceu à parte.
Fica comigo Amigo. Fica em mim e deixa-me ficar em ti.
Anda, vamos ouvir Jorge Palma e ler Mafaldinha. Anda, vamos provar que a amizade é uma coisa concreta. Anda, vamos simplesmente estar um com o outro.

Saturday, August 04, 2007

Um dia...

... eu disse-te:

«Quando achares que não dá mais, bate-me ao de leve no ombro e sussurra-me ao ouvido: “- Chega”. Desfaz o abraço e segue o teu caminho com os chinelos havaianas nos pés. Mas vai devagar: dá-me ao menos tempo para me habituar à tua “não presença”.»

Obrigado. Agora, é comigo mesma.


Nota: Intervalo nas férias. Não resisti. Pronto, estou de novo de férias.