Tuesday, October 10, 2006

8.30 da manhã

Primeira hora da manhã. Uma soneira incontrolável. Cheguei à aula, atirei a mala para o chão com um encolher de ombros completamente conformista, sentei-me sem tirar o casaco e saquei do dossier, só para não perder aquele ar de aluna aplicada com vontade de aprender.
Deitei metade do corpo em cima da secretária (o corpo todo, que era aquilo que dava vontade, também era capaz de ser um bocado demais), pus a mão à frente da boca a disfarçar um bocejo, apoiei o cotovelo na mesa e a cabeça na mão e preparei-me para deixar o espírito vaguear, centrando-se em tudo menos na aula (não convém é dizer o nome da disciplina), desculpando-me mentalmente com o típico slogan “tenho tarde livre, depois revejo isto tudo em casa e amanhã estou pró na matéria”. E comecei a tal actividade acima referida, acenando de tempos a tempos com a cabeça, para dar a tal ideia da aluna aplicada, intercalando os acenos com um “sim, sim… tem razão” e um sorriso triste ou divertido, consoante a expressão do/a professor(a).
Estava eu a meio do processo, quando sem me aperceber começou uma guerra acesa na minha cabeça. Entre o meu lado bom (sim, porque eu também tenho algures um lado bom) e o mau. Alegoricamente, o meu Anjinho e o Diabinho. Com o Diabo do lado direito, é bom deixar claro.Seguiu-se um diálogo francamente anómalo:
“Francamente Ana! É uma oportunidade fabulosa, esta de aprender, e sabes bem que há milhões de meninos no Mundo que davam tudo para a ter. Não tens vergonha?” _ Anjo
“Não tenhas! És adolescente, está na tua natureza sonhar acordada. Além disso, estudas em casa e tiras as dúvidas na próxima aula, qual é o problema afinal? Não é crime ter sono, que eu saiba…” _ Diabo
Sorriso reprovador do Anjo: “Esforça-te lá um pouco! Os teus pais e professores acreditam em ti e estão a fazer tudo ao seu alcance para que sejas bem sucedida. É importante estar com atenção, sabes que em casa não aprendes tão bem…”
Gargalhada irónica do Diabo: “ Que drama tão grande, é só uma aula, não vais reprovar o ano por isso! Sonha lá um bocadinho rapariga… Não deixes que ele (o Anjo) te deixe levar a vida tão a sério. Tens tanta coisa para imaginar…”
Os argumentos caíam como que em catarata. De tempos a tempos o Anjo ajeitava a auréola, como se esta fosse um aparelho de comunicação e a frequência estivesse baixa, lançava-me um sorriso de censura, puro e sem pecado original à vista e ajeitava as asinhas, tão brancas que só mesmo com Neoblanc… O Diabo, sacana por natureza, com a típica forquinha afiada que lançava raios vermelhos ao Anjo (que ia voando de um lado para o outro, para escapar, em vez de investir também), sorria para mim como que a dizer “Ah marota!” e a abanava a cabeça em jeito de aprovação. E eu sentia-me perdida entre os dois. Limitava-me a ouvir, a olhar de um lado para o outro e a concordar com um até ouvir o outro e mudar de opinião.
Estive assim, entre lá e cá, entre o Céu e o Inferno, até ouvir o professor(a) dizer: “Bem, está na hora. Podem arrumar e sair. Não se esqueçam de rever a matéria em casa”.
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A verdade é que me senti frustrada. Por causa daqueles dois imbecis, em 90 minutos não fiz absolutamente nada. Nem sonhei em condições (aqueles sonhos que uma adolescente deve ter, estes absurdos não contam) nem ouvi a matéria.

2 comments:

Rosa dos Ventos said...

Olha que essa história do Bem e do Mal agarra-se à nossa pele para o resto da vida!
Para não teres problemas, faz uma média e vê se ficam empatados - o Anjinho e o Diabinho!

Anonymous said...

aulas universitarias...tal e qual...e entao com noites a dormir pouco, essa parte de "arroxar" nas aulas é mt real =)
a parte do rever em casa cmg nao resulta (nao apetece), mas a parte de tar com atenção tb nao é nada facil (tb nao apetece)...
a parte do tar indeciso entre as 2 hipoteses é mt mais facil d acontecer ;-)